segunda-feira, 20 de junho de 2011

O destino dos velhos em nossa sociedade

Se perguntarmos quem é o idoso no Brasil, hoje, a resposta é obviamente difícil, pois essa noção encontra-se profundamente alteradaniza. Há um componente subjetivo dentro dessa avaliação. Há quem se sinta idoso com 40 anos de idade e outros não se sentem idosos aos 80 anos. É o tipo de sociedade em que vivemos que faz com que as pessoas com mais idade se sintam jovens, mais capazes e com toda a possibilidade de continuar lutando. Isso cria uma realidade nova e, inclusive, provoca problemas novos, porque a pessoa permanece por mais tempo em plena atividade e isto coloca inevitavelmente alguns conflitos de gerações. Vejo isto na própria Universidade de São Paulo, onde os professores que se aposentam não querem deixar a Universidade, querem continuar trabalhando. Mas, ao mesmo tempo, os que vêm chegando, estão na expectativa de ocupar o lugar e, então, empurram aqueles mais antigos, para que não ocupem mais espaço. Acham injusto isso, porque estão lá há muito tempo, esperando sua vez, já amadureceram, já se acham plenamente aptos para assumir os principais encargos e acham que é até necessária essa mudança, para que introduzam um pensamento novo, uma atitude nova.
E, por outro lado. não se pode deixar de reconhecer que, com muita freqüência, o professor chega a momento de sua aposentadoria em plena capacidade intelectual, plena capacidade física, tendo inclusive acumulado uma série de conhecimentos importantes. E isto é um fator de conflito. Aqui já vemos a necessidade de repensar uma situação que sempre foi pensada de maneira diferente: é a situação do aposentado. O aposentado sempre foi imaginado como aquele que está se despedindo da vida: aposentou-se do seu trabalho, de sua função aposentou-se da vida. Isso foi o que sempre se colocou e hoje, dadas as circunstancias, não é mais aceitável.
Aposentar-se é uma circunstancia, uma formalidade que tem asnizapectos práticos e pode significar simplesmente mudança de atividade. De maneira alguma deve ser considerada uma despedida da vida. Não me aposento da vida, estou mudando de atitude, é o que deve pensar e sentir o aposentado. E nisso há certas peculiaridades curiosas até. Ainda há pouco conversava com um amigo que dizia: quando menino, mais jovem, pensava que em chegando a ser um dia avô, deixaria crescer a barba e ficaria contando estórias para meus netinhos. Tudo dentro daquela visão antiga do avô. Mas qual o neto que tem hoje paciência para ficar ouvindo um avô maduro, contando estórias
De fato, é outra a realidade e a disposição dele também é outra, não aquela de ficar contando estorinhas para os netos.
As avós hoje são extremamente jovens, elegantes e querem participar da vida, querem ter o direito de participar da vida. Aquela avozinha de xale, encolhidinha e fazendo bolinhos para os netos representou uma época. Teve seu significado e talvez correspondesse a uma realidade forçada, mas não se verifica mais.
O que notamos hoje é que é preciso repensar as categorias em função da idade. Essa categoria de idoso, de pessoa da terceira idade, se concebe de maneira nova. E isso me coloca, desde logo, perante uma das questões básicas que é a grande opção que em princípio se oferece e até hoje tem sido pouco discutida: o que deve fazer a pessoa em relação à sua velhice. Qual deve ser sua atitude frente à velhice, que pode estar mais distante ou mais próxima? Naturalmente, aqui aparece a questão do que é a velhice, do quê é ser idoso.
Mas a colocação que ainda na maioria danizas vezes se faz é se a pessoa deve optar por se preparar para a velhice. Só que isso tem sido muitas vezes concebido como preparar-se para um suicídio gradativo, pelo qual a pessoa vai se sentindo morrer aos poucos, devendo aceitar que vai morrer mesmo - preparar-se, então, para ir sendo posta de lado, não ter mais participação. Neste "preparar-se para a velhice" há injustiças tremendas, há agressões extraordinárias, porque o que está se propondo é que a pessoa tente ser o menos visível possível, incomodar o menos possível e, quem sabe até, falar o menos possível.
Preparar-se para a velhice, nessa concepção, é convencer-se de que "já deu tudo o que tinha que dar", agora "você é só um consumidor, converse o menos possível e atrapalhe menos". Esta é colocação da não participação, do desligamento. Pode parecer generosa essa idéia da preparação psicológica para o desligamento: alguém se imbuindo da idéia de ser um mero espectador discreto.
Para muitos essa colocação é a que deve prevalecer e alguns até invocam, para justificar isso, certa intenção de generosidade: "Não vamos submeter a pessoa à situação de vexame, a situações de conflito, empurrar o idoso para ter participação, se ele não tem capacidade de participação. Ele pensa que é capaz, mas vai sofrer humilhações, porque às vezes nem fisicamente pode competir". De fato, não se pode colocar a questão dessa maneira. Como ponto de partida, rejeito essa proposta de preparação para a velhice como idéia de desligamento, isto é, o preparar-se para não ser participante, para ser passivo em relação à vida e em relação à sociedade.
No extremo oposto temnizaos outra idéia, que é a proposta da participação, da atividade. O fato de ter mais idade, de ter-se aposentado não deve implicar a demissão da vida e o começo da morte. Bem longe disso, deve significar a mudança de atividades, a preparação no sentido de aceitar que as atividades serão diferentes e, de maneira alguma, aceitar a idéia de não ter atividade.
E o que significa isto de se ter atividades diferentes? Será que não significa recair na proposta de demissão, de afastamento? Na realidade, não. Acho que é preciso encarar com muita objetividade a questão, com bastante serenidade e analisar as coisas como elas se põem na prática. Pensemos em alguém que trabalha em uma empresa: algum escriturário que cresceu na empresa, chegou à posição de chefia e se aproxima o tempo de sua aposentadoria. É comum que este empregado relute em se aposentar; ele quer ficar o maior tempo possível e começa a arranjar desculpas para evitar a aposentadoria. Fica aguardando algum reajuste de vencimentos, mais uma promoção, o que funciona como pretexto, porque a idéia de aposentar-se significa desistir de lutar, desistir da vida e começar a morrer.

Um comentário:

  1. Na verdade falta conscientização na construção de uma sociedade que inclua mais aqueles que ainda têm muito a contribuir.
    Muito bom esse artigo

    ResponderExcluir